Minha Querida Dama (2014). Com a Herança, um Divã a Três em Paris!

Minha-Querida-Dama_2014_cartazSó em ter Maggie Smith e Kristin Scott Thomas – duas Divas do Cinema Britânico – nos créditos de um filme já é um belo convite para assistir. Mesmo se seus personagens só iriam orbitar em torno do protagonista já que a presença delas deixaria no ar que seriam coadjuvantes de peso. Agora quando uma delas está até inserida no título deixa no ar que os papéis podem no mínimo inverter. Mais! Quando a sinopse do filme diz o peso de que sua personagem terá na vida do protagonista e com quem seria o ator, Kevin Kline, se vislumbra grandes cenas entre eles. Era então conferir a Comédia Dramática “Minha Querida Dama“. E sendo em Paris, com direitos a um Romance.

Minha-Querida-Dama_2014_01O personagem de Kevin Kline é Mathias Gold. Que de repente seus problemas monetários acabariam: herdara uma mansão na encantadora Marais, região nobre da capital parisiense. Se despede de Nova Iorque e parte para a França com a intenção de vender a propriedade e começar uma nova vida em algum lugar qualquer. Onde a vinda desse dinheiro sepultaria de vez todos os seus fantasmas. Sem saber que foram juntos na bagagem. Até porque essa herança lhe mostra que nem manteve um relacionamento com o pai após se tornar adulto. Mas uma relação como essa – Pai e Filho – para ser mantida num clima razoável a aproximação deveria partir de ambos os lados. Mathias sentiu o impacto dessa indiferença ainda muito jovem. Pior! Fora punido por sua própria mãe: algo que vem à tona durante o filme. Ele até tentou manter relações amorosas, mas que terminaram levando sua estima por si próprio como também o seu dinheiro da venda de seus livros. E a bebida levou o que restara até das amizades. Assim, ele chega na França: com uma esperança, livros em fase final e sem um tostão no bolso.

Acontece que não seria tão simples como desejara na venda da tal mansão. É que a antiga proprietária, e ainda moradora, teria que morrer primeiro. Tudo porque seu pai a comprara no sistema de “viager“: paga-se por um preço bem abaixo do valor do imóvel, mas não apenas permitindo que o antigo proprietário resida no local até morrer, como também que o novo contribua mensalmente com uma renda para que o antigo até possa cuidar do imóvel.

Minha-Querida-Dama_2014_02A proprietária anterior é a personagem de Maggie Smith, Madame Mathilde Girard já por volta dos 90 anos. Que ouvindo o relato de Mathias, de que estaria sem dinheiro, permite que ele resida num dos quartos. Onde além de uma serviçal, na mansão também reside a filha de Mathilde, a Chloé, personagem da atriz Kristin Scott Thomas. Essa a princípio não concorda com a presença de Mathias, mas depois aceita até para demovê-lo da ideia em vender para alguém que demoliria a mansão para construir um hotel. Que não deixa de ser uma crítica que o Diretor Israël Horovitz faz para as especulações imobiliárias que acabam com o lado histórico de certas regiões e em grandes metrópoles.

Com a tal renda mensal já preste a ser paga, Mathias encontra uma solução nada ortodoxa para conseguir o dinheiro. Uma outra também para não se sujeitar ao ultimato dado por Chloé. E enquanto ganha tempo para vender a mansão… Mas revirando as coisas um certo quarto… Descobre coisas do seu próprio passado que até então não lembrava mais: fotos dele em criança… Ao inquerir Mathilde, lhe bate uma de “meu mundo caiu”, entregando-se as bebidas da ótima adega da mansão. Acontece que sobram estilhaços também para Chloé e a própria Mathilde… Pronto! Estava formado um Divã a Três!

O Diretor Israël Horovitz, que também assina o Roteiro, coloca dois únicos cenários como pano de fundo nessa história. Onde de um lado ficaria a mansão com todo o peso do passado principalmente para Mathias que foi quem mais sentiu, já que ela trouxera novos fantasmas. E de outro, os passeios pelas margens do Sena, como a convidar Mathias que mesmo diante das coisas mais improváveis enquanto seu próprio coração pulsar há de se adequar as novas mudanças.

Minha-Querida-Dama_2014_03Minha Querida Dama” traz os ressentimentos como sequelas das falhas dos próprios pais. Num raio-X do que estaria por trás de alguém que se sente um fracassado na vida. Sem julgá-lo, apenas nos levando a conhecer por esse personagem, e já perto de completar 60 anos, um sentimento que pesa em muitos vivendo conflitos iguais. São segredos de família que quando verbalizados podem sim gerar explosões de raiva, dor, frustração, impotência… mas que mais do que uma aceitação se vier como lições pode revigorar e cicatrizar de vez essas feridas na alma.

Então é isso! Num timing perfeito entre tudo e todos! Com uma ótima também participação de Dominique Pinon cujo personagem juntamente com Mathias voltam após os créditos finais comentando sobre um outro tema também abordado no filme: aulas de língua estrangeira. Mas em qual delas é de mais serventia para cada pessoa. É o uso dos meios mais prazerosos para chegar a um fim! Fica a dica! Fica também a sugestão de um filme Nota 10! Mas que não me deixou vontade de rever.

Por: Valéria Miguez (LELLA).

Minha Querida Dama (2014. My Old Lady)
Ficha Técnica: na página no IMDb.

Leviatã (Leviathan. 2014)

Leviathan 01Por Eduardo Carvalho.

Todo o poder vem de Deus.”

Um sistema político, ainda que não teocrático, mas imbuído de ideais divinos, fará qualquer coisa, justificando suas ações em nome de uma divindade. E o homem comum, inferior a tudo isso, sofrerá as consequências de tais ações.

Leviathan_2014_02.jpgEm “Leviatã”, Kolya é o homem comum, que vive em uma pequena cidade litorânea russa, com filho adolescente e a segunda esposa, e que terá que enfrentar o poder estabelecido. Sua pequena propriedade é alvo da especulação imobiliária, promovida pelo prefeito beberrão, Vadim. Esse pequeno Yeltsin local é apenas um dos componentes de uma Rússia corrupta que emergiu do submundo à luz, com a queda do regime soviético. Além do prefeito, a polícia e o poder judiciário oprimem esse cidadão comum, que tenta lutar honestamente para ver seus direitos reconhecidos. Para tanto, Kolya conta com a ajuda de um velho amigo, Dmitri, agora advogado. Ao tentar jogar com as mesmas armas do prefeito, porém, eles se veem diante de uma força maior: uma vez que aquela cidadezinha litorânea, na visão do diretor Andrey Zvyagintsev, é construída como uma miniatura da sociedade russa, o governo é mostrado como apoiado por uma igreja também corrupta, onde poder espiritual e político atuam juntos para a perpetuação de todo esse grande sistema.

Aqui, de uma espécie de drama de denúncia política, o filme revela uma nova faceta, ganhando ares de tragédia. Uma vez que “todo o poder vem de Deus”, nas palavras do bispo conselheiro de Vadim, inicia-se todo um conjunto de “circunstâncias”, criando um turbilhão de desgraças sobre Kolya, esse Jó contemporâneo incapaz de lutar contra o monstro que o engole, monstro que é metade secular, metade temporal. É o Leviatã hobbesiano aliado ao Leviatã bíblico, uma das grandes construções de um roteiro formidável, merecidamente premiado em Cannes, e que dá o norteamento trágico ao filme.

Leviathan 05A escolha do diretor e co-roteirista Zvyagintsev pelo tom fatalista dá-se desde os planos abertos e escurecidos da natureza do Mar de Barents no início, emoldurados pela abertura solene da ópera “Akhenaton” de Philip Glass – o faraó que quis mudar o sistema de crenças de sua cultura, morrendo vítima das “circunstâncias”. O peso do filme é quebrado por algumas personagens e situações, como a quase caricata esposa do policial e a sequência do tiro ao alvo, quase um sketch de sátira política, para, logo em seguida, o destino se abater implacavelmente sobre os personagens. Importante ressaltar que, como tragédia que é, os personagens não apresentam grandes complexidades ou ambivalências, quase que encarnando estereótipos, ou mesmo arquétipos. São meros joguetes do destino que irá se desenrolar naquele palco. Kolya é um ingênuo, que teima inocentemente em não entender a trama que se abateu sobre sua cabeça. Alcoólatra como o protagonista, Vadim é, a seu modo, uma marionete a serviço de forças econômicas e políticas superiores. Dmitri, idealista e crente dos fatos e não da religião, acredita ser capaz de derrubar o sistema preestabelecido, revelando também sua parcela de ingenuidade. Lilya é a personagem mais típica da tragédia, a esposa que nunca sorri, carregando todas as culpas do mundo pelo que ocorreu ao marido. Diante dessa força inexorável, pode-se pensar que, se “Leviatã” fosse filmado pelos irmãos Coen, ele se chamaria “Um Homem Sério”.

Leviathan 09Difícil compreender de uma só tacada as sutilezas do diretor. A figura da baleia na praia como metáfora de um Estado morto, mas ainda presente, pronto a devorar esse Jonas? As cenas que retratam um Kolya bêbado observando a abóbada da igreja em ruínas, e o filho do prefeito olhando o teto da igreja, contrastam a velha e a nova Rússia. O confronto entre o discurso do padre a Kolya e a fala final do bispo durante a missa revela um abismo entre a sinceridade/ingenuidade do representante do baixo clero, e as palavras hipócritas daquele que caminha pelos grandes círculos do poder. A busca pela verdade, tão propalada, nada mais é do que uma falácia.

Sátira, drama, tragédia, “Leviatã” possui referências iniciais no pessimismo típico da literatura russa, para então aproximar-se de um ideal grego, construindo uma hábil denúncia de um país tomado pela corrupção em todos os níveis, de tal modo que tal câncer parece ter entrado em metástase. Ao fechar seu filme com as mesmas paisagens tomadas pelas ondas furiosas que o iniciaram, Andrey Zvyagintsev mostra que não vê saída para o que ocorre em seu país. Melhor para nós, que ganhamos essa obra feroz e magistral.

Diário de um Jornalista Bêbado (The Rum Diary. 2011)

Eles sabem o preço de tudo e o valor de nada.” (Oscar Wilde)

Primeiramente eu diria que se faz necessário buscar na memória as aulas de História sobre a década de 60 (Surgimento do Feminismo, dos Movimentos Civis em favor dos Negros e dos Homossexuais, a Contracultura, a Revolução Cubana com Fidel Castro, os Hippies, a Guerra Espacial, o assassinato de John F. Kennedy…), como também é válido lembrar das aulas de Geo-Política. Já que estamos falando de Porto Rico, que ainda se mantém ligado aos Estados Unidos como ‘Estado Livre Associado’, e cuja localização era um importante ponto econômico-militar no Caribe para o Tio Sam. Como também, pela beleza natural do Caribe, a especulação imobiliária é como achar uma arca de tesouros. Vimos essa parte, mas em outra “colônia” do Tio Sam em “Os Descendentes“. Digo isso que assim poderão absorver melhor o filme “Diário de um Jornalista Bêbado“.

Por se tratar de período e local dessa história. Onde entre uma golada e outra, o Roteiro do também Diretor do filme, Bruce Robinson, traz muita informação histórica. Claro que em pequenas doses. Mas que deixaram uma vontade de ler o livro, “The Rum Diary“, do jornalista Hunter S. Thompson, o qual o filme foi baseado. E que para entender um pouco mais do personagem principal, também se faz necessário algo da realidade de Thompson. É que ele foi um criador de um estilo denominado Jornalismo Gonzo: em seus artigos há uma total liberdade em narrar um fato, intercalando ficção e realidade, colocando seu parecer. Um jornalista cronista. Nada imparcial. No filme “O Solista” se tem uma ideia de que Thompson realmente fez escola!

Então, por conta disso a ida do personagem principal para Porto Rico caiu como uma luva para uns investidores do ramo hoteleiro. Ele é o jornalista Paul Kemp, vivido por Johnny Depp. Kemp abandonou a Big Apple. Queria Rum, Mulheres e liberdade para escrever do seu jeito as crônicas do dia a dia. Muito sagaz, em seus momentos sóbrios, por tudo aquilo que vê, quase prefere voltar a ficar ébrio por mais tempo. Ciente de que para levar a vida ao seu estilo, precisará de alguém que banque.

Kemp ao largar tudo em Nova Iorque, nem imagina o que vivenciará em Porto Rico. Na bagagem, levará o seu talento para escrever. Aceitando um emprego num jornal local, vai com a cara e a coragem, mas só toma ciência do cargo já estando na ilha, e na presença do Editor-Chefe Lotterman. Personagem do sempre ótimo Richard Jenkins! Coube a Kemp a Coluna de Horóscopo e a de Turistas. Sem outro jeito, ele aceita.

Na Redação ele conhece o Fotógrafo Sala. Papel muito bem interpretado por Michael Rispoli. Houve uma química ótima entre esses dois. Como também há uma cena que entra para a História do Cinema no quesito: dois no volante. É hilária! Como só ela já pagaria em assistir esse filme. Se Kemp realizou o sonho de morar em Porto Rico, Sala mantém o sonho de ir para o México. Mas sem a coragem de largar tudo, vai levando a vida como pode. Kemp e Sala tornam-se grandes amigos. Companheiros também na esbórnia. Mas que os deixa como ‘Dom Quixote e Sancho Pancha’ porque um consegue frear o outro quando se faz necessário.

Sala apresenta a sua Porto Rico para Kemp: lugares e habitantes. É quando Kemp conhece outro jornalista etílico: Moberg. Numa magistral interpretação do Giovanni Ribisi. Ele quase rouba todas as cenas, só não faz isso porque chama a todos para o pódio. Sem querer, Moberg fará com que Lotterman “promova” Kemp. E sem ter planejado, Kemp tem o seu talento também cobiçado por Sanderson. Personagem Aaron Eckhart, que não faz feio, mas pelo personagem poderia ter voado mais alto.

O Grupo de Sanderson quer construir um grande Hotel, aliás, dois. Um, para a Elite. E o outro para os Turistas de Classe Média. Esses, só ficam mesmo no perímetro do Hotel. Têm medo de saírem pelas ilhas, por acharem perigoso. Em parte é! Já que são vistos como os brancos colonizadores. Que lhes tomam o belíssimo litoral.

Kemp vai tentando levar os “dois patrões”, até porque ainda não conseguiu encontrar o tom certo em seu texto. Ele quer ouvir a sua voz interior. Mais uma vez, será Moberg que o levará a isso. Pelo jeito, naquela ilha encantada, entre vudus e muito rum, existe um anjo da guarda um tanto quanto torto. Mas com tanto imprevistos, Kemp não contava por um: o se apaixonar pela mulher de um dos seus patrões, o Sanderson. Ela é Chenault, personagem de Amber Heard. Loura e linda, será disputada por dois galos de brigas: Kemp versus Sanderson. E será uma briga feia! Por fim, a Voz é ouvida. Lhe dando munição para lutar contra os que fazem parte do Sistema, a quem Kemp chama de ‘Bastardos’.

O “Diário de um Jornalista Bêbado” está todo amarradinho. Conseguindo mostrar, e sem entediar, a passagem de Paul Kemp por Porto Rico. Para alguém que só trouxe como bagagem um talento ainda adormecido, ele cresce como pessoa e no campo profissional também. Johnny Depp está excelente! Seu Kemp é único. Muito bom quando um ator consegue diferenciar todos os personagens. Ainda mais que estando no Caribe poderia ter escorregado para o seu Jack Sparrow. Great!

Então é isso! Com um elenco afinado. Paisagem belíssimas. Trilha Sonora à altura da obra. O filme cumpre a sua missão, de entreter, e de querer rever!
Nota 09.

Por: Valéria Miguez (LELLA).

Diário de um Jornalista Bêbado (The Rum Diary. 2011). EUA. Direção e Roteiro: Bruce Robinson. Elenco: Johnny Depp, Richard Jenkins, Giovanni Ribisi, Aaron Eckhart, Michael Rispoli, Amber Heard, Amaury Nolasco, Karen Austin, Marshall Bell, Andy Umberger, Bill Smitrovich. Gênero: Aventura, Comédia, Drama, Romance. Duração: 110 minutos. Baseado no romance homônimo de Hunter S. Thompson.

Curiosidades:
» Bruce Robinson rodou o filme em 2009, em Porto Rico.

Os Descendentes (The Descendants, 2011)

Muito mais que os prêmios conquistados até aqui, dois nomes me fizeram ver “Os Descendentes“: o do protagonista – George Clooney -, e o do Diretor Alexander Payne. Clooney por pertencer a uma seleta lista de que estando nos créditos, tendo oportunidade, eu assisto o filme independente da trama. Payne por ter me conquistado com “Sideways – Entre Umas e Outras“. Ele sabe trazer à tona um momento relevante na vida de um homem maduro. Universos masculinos com sensibilidade. Contextos bem diferentes de ambos os filmes. Pois num, a parada para essa revisão fora por livre escolha. Já nesse aqui, foi o destino que lhe trouxe. Meus Aplausos a Alexander Payne por mais esse trabalho!

Os Estados Unidos é um país de contrastes. Que chegam a ser paradoxais em alguns casos. Em “Os Descendentes” temos um deles na trama principal. Está até no título do filme. Perfeito, aliás! Fala da criação: como educar os filhos. De um lado há pais que, mesmo abastados, mesmo ciente de que um dia seus filhos herdarão tudo, incentivam que ainda jovens trabalhem em períodos de férias. Muitos começam entregando jornais de porta em porta, ainda na pré-adolescência. Fazem isso para que comecem a dar valor ao dinheiro conquistado pelo próprio trabalho. O personagem de George Clooney, Matt King, teve um pai assim. Embora tenha herdado um Fundo por Terras deixadas por gerações passadas, e que o deixaria viver com luxo e mordomias, foi cada vez mais vivendo dos próprios rendimentos como advogado.

Dê a seus filhos dinheiro para fazerem algo, mas não o bastante para não fazerem nada.”

Grande parte dessa herança de família eram terras ainda virgens, em Kuai, Havaí. Num ponto super privilegiado entre serras e o mar. Com matas nativas. Um lugar belíssimo, que algum político cobiçou sim, ao criar a lei que tiraria a perpertuidade delas. Bem, o filme não foca essa relevância até Histórica: “Quem é o verdadeiro dono da terra?” Mas face a especulação imobiliária, e manter um latifúndio com também o intuito de preservar a natureza local, é um caso também a pensar. Muito embora, além de Matt e dois ou três primos, todos os outros queriam a venda de tudo, e o mais breve possível. Já que diferentes de Matt viveram só do dinheiro do tal Fundo. E sem o menor controle, estavam à beira da falência. Entre eles, o primo Hugh (Beau Bridges). Um grande canditado a futuro calo na jornada de Matt.

Mas essa iminente falência era problema deles, dos primos, e não de Matt. Pois esse, como já citei, um acidente do destino bateu a sua porta. Sua esposa, Elizabeth (Patricia Hastie), após um acidente no mar, entrara em coma. E pelos médicos: irreversível. Matt era um workaholic. O que o deixava ausente de casa. Mas também da vida da esposa, como das filhas Alexandra (Shailene Woodley) e Scottie (Amara Miller).

Às vezes as trombadas do destino não vem sozinha, vem com mais coisas. É que Matt descobre que a mulher o traía, e que só não o abandonou, porque o tal carinha, Brian Speer (Matthew Lillard) era casado, e nem cogitava se separar da esposa, Julie (Judy Greer).

Ah sim! Ainda é responsabilizado do acidente, pelo sogro, Scott (Robert Forster). Esse condenava Matt por não ter dado todo o luxo que poderia dar a Elizabeth. Na cabeça dele, se ela tivesse grana a rodo, viveria em shoppings, e longe dos esportes radicais.

Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância.” (Simone de Beauvoir)

Matt, como depositário mor, tinha poucos dias para então assinar a venda das terras. Paralelo a isso, tentar se aproximar das filhas. Deixar de ser o pai omisso. Também tentar explicar a filha caçula que iriam desligar os aparelhos que mantinham a mãe viva. Digerir a descoberta de ter sido traído, e pela desculpa por ter sido um marido ausente. Também aceitar o fato que a Alexandra já era uma moça, e que agora poderia se enamorar de um cara como o Sid (Nick Krause). Como também de se entrosar com ele. Enfim, dar um novo rumo a vida.

O filme é muito bom, dentro de tudo a que se propos mostrar. Em se tratando do Havai, dá para imaginar paisagens deslumbrantes. A Trilha Sonora segue a cultura local. Houve química entre os atores. O final traz a assinatura do Payne. Quem viu Sideways irá sacar. Bem, eu saquei e sorri. Vale o ser visto! Mas não me deixou com vontade de revê-lo.

Por: Valéria Miguez (LELLA).

Os Descendentes (The Descendants, 2011). EUA. Diretor: Alexander Payne. Roteiro: Alexander Payne, Nat Faxon, Jim Rash, baseados na obra de Kaui Hart Hemmings. +Elenco. Gênero: Comédia, Drama. Duração: 117 minutos. Classificação: 14 anos.

PRÊMIOS:
– Vencedor do Globo de Ouro 2012 de Melhor Filme – Drama e Melhor Ator (Drama) para George Clooney.
– Melhor filme de 2011 pela Associação dos Críticos de Cinema de Los Angeles.

Soul Kitchen. 2009

É tão bonito quando a gente pisa firme
Nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos
É tão bonito quando a gente vai à vida
Nos caminhos onde bate, bem mais forte o coração
“.

Segundo filme que vejo de Fatih Akin. O anterior, foi ‘Do Outro Lado‘. Que eu também recomendo. Agora, ambos nos deixa uma emoção oposta a da outra. Enquanto ‘Do Outro Lado’ fica uma tristeza por algo que perdemos, e não tem mais como mudar… ‘Soul Kitchen‘ é um libelo ao que ainda podemos mudar, até com certas mudanças avassaladoras em nossas vidas. Mais do que não desistir, é que se tem que querer ir atrás do sonho. Esse é daqueles filmes que nos faz sair da sessão: leve, dançando, cantarolando… E até querendo dar uma Chef na nossa própria cozinha. Mesmo que seja para fazer uma refeição rápida com o que se tem na geladeira.

Em ‘Soul Kitchen‘ temos um jovem com raízes turca, mas que abraçou a Alemanha como sendo a sua verdadeira pátria. Assim, além de tentar se adequar a realidade local, meio que chama para perto de si, outros na mesma situação. Ele é Zinos Kazantsakis (Adam Bousdoukos). De um velho galpão que comprou numa zona decadente de Hamburgo fez um restaurante, e que nomeou de Soul Kitchen – soul, como a música. Primeiro, ainda bem que não traduziram o título do filme no Brasil. Depois, o Soul é um ritmo onde tudo deve fluir junto: melodia, voz, instrumentos, artista… E acompanhando o filme, vemos que é isso que Zinos quer para o seu restaurante: que todos se sintam integrados, estando ali. Tanto, que nem se importa de usarem um espaço do galpão para ensaio de uma banda.

Mas de repente a vida de Zinos parece ir de ladeira abaixo. Os clientes locais ficam na mesmice de só querer os mesmos pratos. As despesas estão maiores que o caixa. Para ainda lhe desconcentrar, tem a namorada, Nadine Krüger (Pheline Roggan), indo trabalhar em Xangai. Tem também seu irmão, Illias (Moritz Bleibtreu), que lhe pede um emprego para poder cumprir sua pena saindo diariamente da prisão. Mas Illias não quer trabalhar. Quer continuar na maladragem, nas apostas e jogos. Zinos consegue um Chef um tanto excêntrico: Shayn (Birol Ünel). De alma cigana, Shayn gosta de Zinos lhe ensinando umas receitas básicas que traria toda a diferença para o seu local, mas  pelo paladar geral da clientela fica o impasse se irão aprovar.

Como se não bastasse a pressão, Zinos encontra com um amigo de escola. Esse, Neumann (Wotan Wilke Möhring), tem uma imobiliária. Mas tem também, um outro tipo de trabalho, e ilícito. Neumann se interessa pelo restaurante. Mas precisamente, seu foco de interesse é o terreno. Assim, vai jogar sujo para conseguir a compra do Soul Kitchen.

E não acabou não! Tem mais! Além dos Impostos atrasados, o restaurante terá que passar por reformas, por ordens do Fiscal da Vigilância Sanitária. Zinos, ainda ganha uma baita dor lombar. Sem plano de Saúde, Zinos conhece Anna (Dorka Gryllus), uma Fisioterapeuta. Que como as dores de Zinos se intensificaram – após carregar nas costas, Lucia (Anna Bederke), sua garçonete, que apagou de tanto beber -, Lucia leva Zinos a um Knochenbrecher (quebrador de ossos). Onde ficamos na dúvida se rimos, ou se sentimos a dor junto com ele. Essa cena me fez lembrar do Conde Joffrey de Peyrac, da saga ‘Angélica – A Marquesa dos Anjos’, de Anne e Serge Golon.

Assim, entre incêndio, prisões, despejo, traição, dores, leilão… Zinos terá que decidir onde está de fato a sua alma. E que, como falei no início, ficamos de alma leve, após o filme. Até por nos mostrar mais de um renascimento.

A Trilha Sonora também é excelente! Assistam até os créditos finais, por ele vir como um complemento ao filme.

Por: Valéria Miguez (LELLA)

Soul Kitchen. 2009. Alemanha. Direção: Fatih Akin. Roteiro: Adam Bousdoukos e Fatih Akin. +Elenco. Gênero: Comédia. Duração: 99 minutos.