Assassinos por Natureza – Natural Born Killers
Direção: Oliver Stone
Gênero: Aventura, Ação, Violência
EUA – 1994
Natural Born Killers (literalmente, assassinos natos [matadores natos]), de Oliver Stone, traz ao cinema, junto com “Cães de Aluguel” e “Pulp Fiction”, ambos de Quentin Tarantino, a estética da violência, tornada espetáculo. Trata-se de desfazer o discurso maquiador da violência e mostrá-la realisticamente, o que corresponde ao naturalismo em literatura (Emile Zola).
Stone usou todos os recursos conhecidos para mostrar sua idéia em imagens, da filmagem super-8 à comédia tipo “I love Lucy” (acho que ninguém aí vai lembrar disso rs) – cena da família de Mallory -. Vale a pena manter o controle remoto em mãos e passar quadro a quadro determinadas cenas, pq algumas chaves para a compreensão da personalidade da dupla são dadas muito rapidamente (p. ex., a violência sofrida por Mickey nas mãos de seu pai, o qual inclusive devora ou arranca a dentadas um pedaço do próprio filho na infância, o que só é visível qdo usamos o quadro a quadro).
O tema do filme não é a dupla psicopata Mickey e Mallory (brilhantemente encarnados por Woody Harrelson e Juliette Lewis, esta com sua maravilhosa cara de porra-louca full time) – mas o que a mídia faz da dupla e a identificação idolátrica do povo com ela.
A questão é: pq os criminosos exercem tamanho fascínio, a ponto de serem endeusados pela população?
Cito dois textos de Freud que tratam de criminosos: “Totem e Tabu” (1913) e “Dostoievsky e o parricídio” (1928).
Em “Dostoievsky e o Parricídio”, Freud diz que o criminoso tem duas características: uma quantidade grande de pulsão agressiva e a incapacidade de se ligar afetivamente a objetos humanos. Em suma, um egoísmo (narcisismo) imenso.
Em “Totem e Tabu” (obra que estuda o animismo e o totemismo, a mais antiga religião humana, e a semelhança entre a mente do selvagem primitivo, da criança e do neurótico obsessivo) Freud nos mostra o mecanismo das instituições penais.
Todo homem traz em si uma agressividade inata, por suas pulsões destrutivas dirigidas ao mundo externo. A sociedade exige que ele recalque essa agressividade e a sublime ou desvie para funções socialmente aceitas. Alguns não aceitam tal restrição de sua agressividade (ie, de sua liberdade) e infringem as leis que a proíbem de ser satisfeita – tais são os criminosos.
Porém cada homem tem, em seu inconsciente, o desejo dessa transgressão, seja, o desejo de satisfazer suas pulsões (agressivas e eróticas). Caso alguém satisfaça tal desejo e permaneça impune há o risco de despertar o mesmo desejo nas outras pessoas, que não hesitarão em satisfazer seus desejos anti-sociais (especialmente incesto e parricídio, ie, assassinato).
Por isso a Lei deve se fazer observar graças a uma pena imposta contra os transgressores (essa pena visa a intimidar e dissuadir os demais de cometer o ato proibido, enquanto tb pune o delinquente). O Direito necessariamente é coativo para garantir a observância, pelo medo, das suas injunções. é a coação que especifica a norma jurídica e a difere de outras normas sociais.
Mas o desejo homicida permanece no inconsciente e é contra esse desejo que se volta a instituição penal – pq somos todos “miseráveis pecadores”, nas palavras de Freud – é preciso evitar o contágio pelo exemplo.
Por isso admiramos assassinos e ladrões – pq eles ousaram satisfazer um desejo que nós próprios possuímos em nosso inconsciente. assim, satisfazemos nosso desejo através dos criminosos, igualmente, rejubilamos ao ver o criminoso exemplarmente punido, pq a punição sanciona o nosso recalque. Se não houvesse punição, não teríamos pq nós mesmos respeitarmos o “pacto social”.
O povo que aplaude Mickey e Mallory na verdade os aplaude pq eles ousaram satisfazer os mesmos desejos que nós temos. Esse aplauso não significa necessariamente aprovação – tanto que exigimos sua punição e ninguém deseja ver criminosos soltos e impunes.
Por: Vampira Olímpia