Por: Karenina Rostov.
[Contêm revelações sobre o enredo.] [E o filme contêm cenas de sexo explícito.]
Era uma vez um diretor de cinema argentino chamado Gaspar Noé que resolveu nascer novamente para contar a história de AMOR, segundo o seu entendimento, entre seu pai Murphy e a namorada dele Elektra. Uma história instigante e complexa.
Gaspar nasceu por obra do acaso. Seu pai Murphy e a namorada Elektra acabaram envolvendo uma terceira pessoa: a jovem Omi. E no encontro íntimo do trio acidentalmente a convidada acabou engravidando. Consequência essa que acabou dando novo rumo a vida de cada um deles. Mudando planos, projetos e provavelmente possíveis sonhos. Foi assim que se deu a reviravolta ‘no LOVE’ e a jovem convidada tornou-se mãe, aos dezessete, por acaso, de Gaspar.
Murphy, um jovem diretor de cinema. Elektra, uma artista plástica linda, atraente tal qual a Elektra da mitologia grega. Muitos autores falaram sobre ela… e Eurípides deu um tratamento especial transformando-a em divindade. Enxergando em Elektra uma mulher amargurada e impulsiva, levada mais pela fúria do que pela maldade… A impressão que dá é que Gaspar Noé parece sentir muita admiração pelo mito Elektra. A formosura, a força e por ela ser como pólos divergentes: boa e má; desajustada e correta; que ama compulsivamente e odeia ao extremo; sendo como o fim e o começo. Afinidade e identificação.
LOVE é praticamente contada através da linguagem corporal, um ensaio fotográfico, ou uma peça teatral, e no palco três personagens se digladiando entre o tato, olfato, felação e a suficiência da linguagem não-verbal, não dando lugar ao tabu, pré-conceitos, ou julgamento de valor e nem para as palavras propriamente ditas pois poderiam quebrar o feitiço que o casal buscava nas relações ardentes mais de volúpia do que de encanto.
Gaspar, agora com dois aninhos de idade é acordado pelo celular de seu pai, enquanto que no quarto ao lado Murphy e Omi estavam em seu momento íntimo de amor, embriagados de sexo muito antes do amanhecer. Insistentemente chama o pai. E só assim Murphy atende àquela ligação. A partir daí o pequeno Gaspar sai de cena e todo o desenrolar da história, então em flashback, é focada nos acontecimentos de dois anos atrás. Murphy se vê mergulhado nas lembranças com a amada Elektra.
A chamada era da mãe de sua ex-namorada Elektra. Entra em cena todo aquele seu passado ardente. Pouco mais de dois anos se passaram e Murphy, agora aparentemente sossegado, outra pessoa, outra vida, família formada, pai e marido, trabalho, contas a pagar, compras, lazer… rotina. E agora quem fazia parte do trio é ele, a sua atual companheira e o bendito fruto dessa relação, o Gasparzinho. Rs!
Na chamada recebida, a mãe de Elektra, disse-lhe que a filha sumiu do mapa já há algum tempo e que ela estava muito preocupada, porque Elektra passou a sofrer de depressão e a ter tendências suicidas.
Parece que Murphy arquivou aquela sua história de amor e tocou sua vida dando novo rumo a ela. E aquele LOVE que dizia sentir por Elektra, o que poderia ter acontecido? Simplesmente desapareceu? Acabou quando ela ficou sabendo que a jovem vizinha engravidou de seu amado? Murphy só voltou a pensar na sua ex-namorada depois da ligação da mãe dela. O amor entre o casal acabou? Ou como diria um poeta foi eterno enquanto durou? Ou só estava adormecido?
Reza a lenda que, o corpo é o santuário da alma. E o sexo é o complemento do amor. Estão interligados corpo-alma-sexo-amor. E quem ama deveria jamais se descuidar.
Amor é mesmo uma caixinha de surpresas?! A culpa de não ter sobrevivido? Se existe nessa história um culpado, parece recair sobre a Elektra. A teoria literária investiu nessa crença de que a culpa é geralmente da fêmea e o autor quase sempre trata de matar o AMOR pondo um ponto final na vida dela, principalmente quando se trata de ligações perigosas, envolvendo mais de duas pessoas.
Sabe-se que em um relacionamento a três, há perdas e danos e certamente alguém acabará sobrando ou sofrendo as consequências.
Gaspar Noé usou e abusou de alguns clichês físicos para literalmente gozar na cara do espectador. O relacionamento emocional entre Elektra e Murphy, fora superficial? Tiveram bons momentos, se divertiram, eternizaram suas lembranças através de fotos, vídeos, pinturas, compartilharam anseios… até o momento em que um novo ser resolve nascer. Então se deu o corte do cordão umbilical de uma história que foi linda para começar do zero uma outra.
Afinal, quanto tempo mesmo dura uma paixão? Dizem que há um prazo de validade.
Gaspar Noé resolveu dar uma deixa ao estampar na parede de LOVE o cartaz do filme “Saló ou Os 120 dias de Sodoma”, de Pasolini, dando uma pista aos que testemunhariam o conto de fadas entre Murphy e Elektra, ou seria só um pré-texto?
Era de fato LOVE? Era AMOR? Ele só passou a pensar em Elektra dois anos depois.
Noé precisou nascer para trazer à tona uma história de amor dos tempos modernos. Onde tudo pode ser possível num relacionamento quando as pessoas envolvidas consentem. Elektra e Murphy tinham afinidades de sobra no quesito relacionamento sexual. Só que ele próprio confessou-se um conservador.
Talvez o filme seja condenado por pecar pelo excesso de tórridas cenas de sexo por mais de 90 minutos. Sexo, muitos gostam, mas ficam incomodados em testemunhar terceiros mostrando suas performances além de quatro paredes. Não seria hipocrisia? Afinal todo ser é resultado de sexo entre duas pessoas, e como diz um filósofo de botequim, “somos resultado de um orgasmo… ou uma gozada?“
Bem, pôr um ponto final no relacionamento nem sempre significa por um ponto final no sentimento de AMOR. E Elektra em algum momento de LOVE pergunta a Murphy: “- O que significa AMOR? Você saberia responder?“
LOVE (2015).
Ficha Técnica: na página no IMDb.
P.s: Essa é uma compilação de um texto bem mais longo. Para o ler na íntegra, clique aqui.