Os Terraços (2013). A “Casa Grande, Senzala e Capitães do Mato…” na Sociedade Argelina

os-terracos_2013_posterdiretor-merzak-allouachePor: Valéria Miguez (LELLA).
Em “Os Terraços” o Diretor Merzak Allouache, que também assina o Roteiro, retrata de um jeito bem cru a vida de alguns dos moradores da capital argelina. Que mesmo sendo Argel uma cidade construída sobre colinas, daí os terraços terem um papel em destaque também nessa sociedade, e ao longo de sua história, mas justamente por essa visão privilegiada até do lindo azul mediterrâneo, ao colocar as histórias centradas nos telhados dos prédios parece dizer a todos do quanto estão desperdiçando um tempo importante de vida. Até porque o apelo que vem dos altos falantes das mesquitas parece ser como um barulho a mais numa cidade já bem barulhenta pelos carros e seus engarrafamentos… Abrindo um parêntese, por algo também comum a seguidores de outras religiões: em tendo-as como a absolvição dos atos, até criminosos, cometidos… Enfim, talvez o que Allouache queira dar a todos é uma chance de descortinarem novos horizontes. Nem que seja apenas para saírem um pouco dos próprios problemas. O que por sua vez também os levariam a ver se há uma outra saída… Ou não! Predestinado ou não! Cíclico ou não! Impostos ou não! São os contrastes da vida num quadro meio surreal pelas mãos do Diretor! Bravo!

argel_capital-da-argeliaPartindo de cinco terraços em bairros diferentes (Casbah, Bab El Oued, Belcourt, Notre-Dame d’Afrique e Telemly), com variações sócio-econômicas entre eles, o filme expõe o que se passa no interior de cada uma das pessoas! Onde uma maioria até tenta sobreviver da violência, da intolerância… do dia-a-dia e até por fechar os olhos diante de alguns fatos! Que embora não tenha sido ético, um dos que ignorou algo, talvez porque aquela parte da cidade já esteja tão carente… Numa de os meios justificando os fins? No fundo pode até terminar sendo absolvido por aquele que assiste o filme. Veja, e faça o seu próprio julgamento!

Em “Os Terraços” as histórias acontecem num único dia indo do amanhecer à meia-noite, com as cinco chamadas às orações de um feriado religioso. Entoadas num tom entristecido pelo muezzin como a apresentar o que estar por vir. Tendo como pano de fundo a mítica cidade branca, com seu mar azul num horizonte bem sugestivo. São nesses intervalos, entre essas pausas para orações e meditações… Que a vida dessa gente acontece! Ou deixa de existir…

Onde os recados, ou mesmo os apelos, por vezes até salta de um terraço para outro, conscientemente ou não, inconsequentes ou não… São gritos emudecidos até pelo medo de que acabe levando a barbárie para esse outro o qual o seu silêncio, ou mesmo a sua admiração, mais do que um pedido de ajuda, seria como um colírio para olhos já tão cansados de chorar… Quiçá, por um pedido de amizade… Mas aí quando esse outro atenta… Já era! Que por sua vez, por certo irá pesar na balança naquela absolvição o qual mencionei mais acima, mesmo tendo sido noutra das histórias mostradas em “Os Terraços“.

os-terracos_2013_cenas-do-filmeSão várias reflexões que o Diretor Allouache nos deixa em “Os Terraços“. Uma delas até pela visão de uma das personagens, uma cineasta que em um dos terraços tenta mostrar a toda a beleza de Argel para um documentário, o “Argel, Joia do Mundo Árabe“. Não apenas por terem diante de si todo o esplendor do Mar Mediterrâneo, a jovem pede ao cameraman que tente não posicionar referências a outras religiões…. Onde mesmo querendo dar a capital uma cara de cartão postal, ou uma identidade própria… Fica difícil até por ser uma cidade sobrevivente a décadas de lutas internas… Fica difícil não expor uma violência que já impregnou em muitos habitantes… Uma violência que pode estar logo ali bem próximo a ela… Ou como num outro terraço, e num bairro mais popular, o manter um ente familiar em cativeiro, foi por sua proteção… Mas sobretudo uma violência que pesa muito às mulheres! Até porque os homens se veem como donos delas…

Os Terraços” é um filme até para ser revisto! Não apenas pelo olhar inquietante de Allouache, ou até por conta disso, mas mais por expor vidas humanas sem máscaras. São dramas forjados também desamparo da política local: faltam moradias, água… Num país rico em petróleo, são desigualdades sociais que já deveriam terem sido sanadas… É o retrato de uma sociedade que até saltou dos apartamentos já tão apinhados de gente para “puxadinhos” em alguns desses terraços… Uma favelização que irá sentir a “força” da especulação imobiliária…

Paro por aqui! Para não tirar a surpresa de quem ainda não viu, como até motivando aos que já viram em ver de novo. Pois embora “Os Terraços” traga contextos bem fortes, até cruéis, o filme deixa uma leve sensação de que há esperança na humanidade. Mesmo que pela curiosidade ainda inocente de uma criança! Parabéns ao Diretor Merzak Allouache! Um Filme Nota 10!

Os Terraços (Les Terrases. 2013)
Ficha Técnica: na página no IMDb.

O Ano Mais Violento (A Most Violent Year. 2014)

o-ano-mais-violento_2014_cartazPor Humberto Favaro.
O ano de 1981 é considerado um dos mais violentos da história de Nova York. Fora a miséria e as incertezas do plano econômico adotado pelo então presidente, Ronald Reagan, a cidade sofreu um corte brusco de investimento, que deixou vários norte-americanos jogados aos criminosos. Para se ter ideia, os índices de roubos, assaltos, estupros e assassinatos colocaram o país inteiro em estado de alerta durante este período.

o-ano-mais-violento_2014_01O filme O Ano Mais Violento, estrelado por Oscar Isaac e Jessica Chastain, faz um retrato fiel desse assombroso contexto e aborda com inteligência a tensão e o desespero de seus personagens principais. Ao mesmo tempo em que fala da violência pura, com pessoas assaltando as outras e agressões físicas, o diretor J. C. Chandor mostra que realmente conhece o contexto da época a apresenta a atmosfera necessária para enredos desse gênero, que são bem sombrios e nebulosos.

Com uma direção segura, o tempo inteiro o público participa de alguma forma da trama, pois é instigado a entrar no ambiente de uma trama densa, que traz a sensação de que o pior ainda está por vir. Com pouca trilha sonora, Chandor é confiante ao transmitir o cenário nebuloso do protagonista Abel Morales (Isaac), dono de uma empresa de combustível que quer prosperar ainda mais nos negócios.

o-ano-mais-violento_2014_02Com um estilo de vida de alto padrão, o executivo fecha um negócio promissor e se compromete a fazer o pagamento em 30 dias no máximo. Nesse meio tempo, seus funcionários começam a ser ameaçados e agredidos, o que os levam a carregar armas ilegais para se protegerem. Para piorar, os negócios da companhia passam a ficar sob investigação da promotoria pública, que é comandada por Lawrence, personagem de David Oyelowo (Selma). Anna Morales (Chastain), esposa de Abel, passa a fazer a contabilidade da empresa e a partir daí as notícias pioram cada vez mais para o executivo, que é obrigado a achar uma saída para cumprir todos os seus compromissos financeiros e descobrir quem está por trás dos ataques aos seus funcionários.

Escalado para fazer “Star Wars: O Despertar Da Força” e “X-men: Apocalipse“, Oscar Isaac chama atenção por mergulhar em seu personagem. Seus olhar tenso é o verdadeiro reflexo de um homem preocupado, que começa a ver seu império ir por água abaixo, e também o retrato da crise de uma época em que as pessoas precisavam se reinventar na marra para não ruir de vez na sociedade. A sempre ótima Jessica Chastain também merece destaque ao transmitir o sofrimento e a melancolia de Anna, que sempre se mostra preocupada com a segurança de suas filhas e de seu patrimônio.

É verdade que algumas traduções de filmes não fazem tanto sentido, mas O Ano Mais Violento cai como luva neste caso, principalmente por seguir ao pé da letra o original, “A Most Violent Year“, e por fazer um ótimo contexto da tensão e do quanto a violência urbana prejudicou várias esferas da sociedade em 1981. Além disso, o longa conquista por também criticar o individualismo das pessoas e a necessidade excessiva de cada um querer ficar rico a qualquer custo.

Avaliação: 9.0

O Ano Mais Violento (A Most Violent Year. 2014)
Ficha Técnica: na página no IMDb.

Seus Cem Anos Fizeram Companhia a Solidão de Muitos! Valeu Gabo!

gabriel-garcia-marquez_cem-anos-de-solidaoSe o exercício da leitura é num momento de solidão, de quem escreve precisa antes estar em meio as vozes do mundo para buscar a inspiração. E então, talvez, um recolhimento para encontrar o tom certo da história. Gabriel García Márquez partiu para o mundo, mas foi numa volta às raízes que vislumbrou que tinha em sua bagagem uma grande história. Nessas tiradas em que o destino presenteia alguém, sua mãe lhe chama para vender a casa dos avós com quem passara a infância. E entre memórias da família e lendas populares do interior da Colômbia, nasce “Cem Anos de Solidão“.

Cem anos de solidão” se passa na fictícia aldeia de Macondo e acompanha ao longo de gerações a saga da família Buendía. Obra prima literária da segunda metade do século XX é um livro que dispensa apresentação e que deveria ser lido principalmente pelos latinos americanos.

Eu li Cem anos de solidão há muito tempo atrás. Com isso traçar uma análise de toda a história ficariam muitas lacunas. O mais certo seria reler o livro e que até o faria com prazer, mas com o falecimento de Gabriel García Márquez não teria tempo hábil para então prestar um tributo a esse grande escritor. Deixando essa singela homenagem a quem não chegou aos cem anos de idade, mas que por certo suas histórias nos levaram a viver tanto quanto.

Assim, contando algo que ocorreu-me tão logo terminei de ler Cem anos de solidão”, deixando como sugestão para quem for ler ou mesmo reler o livro. Pegue uma folha em branco e um lápis. Vá montando uma árvore genealógica à medida que for avançando na leitura. Comece pelo personagem principal José Arcadio Buendía; o casamento com Úrsula Iguarán; os nascimentos de filhos e netos; marcando também as mortes… Pois a trama é muito rica em personagens e histórias até particulares. Com esse diagrama em paralelo parece que fazemos a mesma trajetória ao mesmo tempo e com isso sem perder nada. E foi assim que quando eu reli e chorei no final. Quando se sente no âmago a solidão desses cem anos.

Difícil não era inventar histórias. Difícil era fazer um norte americano, um europeu acreditar na realidade de qualquer país da América Latina.” (Gabriel García Márquez)

O Escritor se vai (1927/2014), a Obra permanece!
Aplausos a Gabriel García Márquez!
Vai em Paz!.

Serra Pelada (2013)

serra-pelada_cartazSerra Pelada de Heitor Dhalia é um filme incrível. Incrível as reconstituições, figurinos, os cenários, com montagem perfeita, com perfeitas as inserções de imagens reais da época, incluindo os noticiários, fotografia, edição e o roteiro amarra muito bem o drama das personagens fictícias tão reais e para a minha alegria no final uma cena feliz!

Eram garimpeiros, mas poderiam ser jogadores de futebol ou qualquer outra profissão que possibilitasse a realização dos sonhos pela posse repentina de muita grana e o acesso aos caminhos do poder.

A narrativa em primeira pessoa feita pela personagem Joaquim (Juliano Andrade) coloca a gente dentro do espírito das cenas que se sucedem possibilitando que nossa  percepção vá além da ação, deixando o filme longe de ser apenas um filme de ação.

serra-pelada_joaquim-e-julianoAmigos de infância fracassados cada um a seu modo, Joaquim e Juliano (Juliano Cazarré) vão à corrida do ouro. Juliano não tem família, é boxeador de apostas e foge de uma dívida com um agiota que o ameaça. Joaquim é professor que fica desempregado, com mulher grávida e decide que seu filho será rico. Um é grande e forte o outro magro e mirrado. Poderia ser uma dupla tipo Master and Blaster de “A máquina mortífera”, mas o fortão da história decide pensar, descobrir que tinha talento e gostava de matar e dar asas às suas ambições.

serra-pelada_os-amigos-de-infanciaO ouro transforma Juliano e o sonho não abandona Joaquim. Se a sede de poder traz para Juliano a liberação de seus instintos opressores e assassinos, onde o ter sobrepõe a outros valores, é a fidelidade a tônica de Joaquim. Fiel ao amigo, fiel ao projeto de enriquecer para o bem de sua família. Juliano se integra perfeitamente ao ambiente violento, torna-se personagem do faroeste caboclo que era Serra Pelada, uma terra onde a lei era a força, tirania e corrupção.

serra-pelada_garimpoO filme de milhares de figurantes é enxuto focando poucos personagens, enfatizando no drama de cada um em detrimento de entrar em aspectos históricos da loucura que foi tudo aquilo e o contexto político da época. O que não deixa de explicar os jargões locais, a estrutura da exploração e venda e o seu domínio tomado pelo governo militar com mudanças das leis do garimpo que passou a ser oficialmente o único comprador de ouro, proibir a presença de mulheres o que “privilegiou” os homossexuais – chamados Marias (que com a chegada da AIDS foram expulsos do garimpo) -, armas e bebidas alcoólicas o que não evitou as bebedeiras, prostituição, tiroteios e mortes  transferidos para 30 km adiante.

serra-pelada_01Juliano e Joaquim prosperam e tornam-se proprietários de um pequeno barranco tornando-se prisioneiros da febre do ouro, num mundo onde se busca e encontra riqueza, mas onde não há nenhum interesse em se tornar mais civilizado.

serra-pelada_sophie-charlotte-e-mateus-nachtergaleO barranco desperta o interesse dos donos de vários outros e Juliano resolve a situação à moda local. Um deles é Carvalho (Matheus Nachstergale), mantenedor de Tereza (Sophie Charlotte)  com quem Juliano irá se envolver. O outro é vivido por um Wagner Moura calvo e carismático, gângster e até engraçado, num papel menor, mas de muita importância na trama.

Wagner interpretaria Juliano, mas devido à proibição de gravar no local e a necessidade de se recriar todo o ambiente atrasou e impediu o ator de interpretar esse papel, tal qual Daniel Oliveira que daria vida ao Joaquim.

Esse é um filme que vale a pena ser visto e sua beleza justifica os 11 milhões da produção e os quase 5 anos que Heitor demorou para concluir o roteiro. Uma obra de arte.
Nota: 9

Que tal um passeio em Paris?

ratatouilleCom uma taça de champanhe, ou mesmo uma xícara de café, convido-os a conhecerem Paris, essa cidade que faz parte do nosso imaginário. Pelos Filmes, é claro! Vem comigo!

champs-elyseesQuerendo ver que por lá num país de primeiro mundo também há uma rede de corrupção entre o setor público e o privado assistam esse ótimo filme: “A Comédia do Poder” (L’Ivresse du Pouvoir). Quisera ter por aqui no nosso país duas juízas como as desse filme. Mais detalhes aqui.

Para quem gosta de Thrilher, “Caché” (Hidden) é uma boa! O filme também foca a discriminação entre franceses e argelinos. A cidade das classes mais favorecidas, como do lado carente. Muito embora eu em minha análise preferi ir por um outro ângulo. Um trechinho:

paris_01Há certas tomadas de atitudes que soam como gritos silenciosos de pedidos de atenção. Algo como: “Oi, estou aqui!” São pedidos mudos que por vezes tresloucados na forma, mas que foram como uma última tentativa. E quando não são de fato a derradeira – aquela que não tem mais volta. Alguns desses pedidos, mesmo que incômodos, podem até serem vistos como atitudes infantis. Mas seja lá como foi, ou mesmo de quem partiu, não querem nada de material.

Pois é, um Drama que envolve a vida dos personagens de Daniel Auteuil e Juliette Binoche. Quer saber mais? Tem aqui o texto na íntegra.

Aqueles que curtem uma Comédia irão se deliciar com essa: “O Closet” (Le Placard). Com Daniel Auteuil e Gérard Depardieu. Essa dupla deu química. A tônica aqui, muito mais que uma homofobia, fica em como certas pessoas viajam na maionese. O personagem do Auteuil para não perder o emprego deixa que pensem que é gay. E o seu jeito metódico que até então incomodava passa a ser visto de outra forma. O que mudou foi a cabeça das pessoas. Conto mais aqui.

Na empolgação esqueci de deixar registrado a quem ainda não está familiarizado com o Cinema Francês de que ele não tem o mesmo ritmo dos filmes de Hollywood. Muitos o acham lentos demais. O pior é que acabam perdendo ótimos filmes.

amelie-poulainHumm! Pausa para um delicioso café. Ou mesmo um chocolate quentinho. Que ir saborear num lado de Paris onde a vida passa tranqüila? Saindo do centro frenético da capital parisiense e indo parar no subúrbio. Melhor ainda! Sendo servidos por uma doce garçonete: Amélie Poulain. É! Quem já viu “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (Le Fabuleux Destin d’Amélie Poulain) se apaixona por esse filme. Eu já o vi algumas vezes. Quem ainda não viu, assista. Veja, ou melhor, rememore os próprios prazeres de outrora que por conta do corre-corre atual nem os sinta mais. Veja um pouco mais pelas lentes mágicas de Amélie.

Não podendo esquecer que Paris também nos leva às Galerias de Artes. Para esse filme caso não queira assistir sozinho chame um amigo e vejam: “Meu Melhor Amigo” (Mon Meilluer Ami). Uma deliciosa comédia onde a um Marchand sua sócia lhe impõe um prazo para apresentar um grande amigo. Ele para não perder o objeto da aposta, aceita. Mas não será tão fácil como imaginava encontrar um verdadeiro amigo. E nessa procura ele segue de táxi.

paris-francePara finalizar um pouco de tudo que nos remete a essa cidade: luz, moda, arte, paixão… Em “Paris, eu te amo” (Paris, je t’aime), há tudo isso e muito mais. São 21 Curtas na visão que cada Diretor tem por ela. E por eles, com eles, nosso giro é maior. Temos uma radiografia completa da cidade, dos seus moradores e dos que apenas estão de visita. Um foco maior, aqui.

Eu sou Valéria Miguez, mas podem me chamar de Lella. Se foram olhar meus textos na íntegra, viram que tenho um jeito peculiar de analisar um filme. E que tento ao máximo não tirar a surpresa, e sim motivá-los. See you!

[Em 06/07/2008. Meu primeiro texto para uma Coluna numa Revista Eletrônica.]

Selvagens (Savages. 2012)

Tempos atrás, uma famosa crítica americana declarou estar aliviada no momento de sua aposentadoria por nunca mais ser obrigada a ver um filme de Oliver Stone. Ela tinha razão, pois embora o diretor tenha inegável talento, seus filmes costumam ser longos e chatos. Até mesmo seus melhores trabalhos como “Assassinos por natureza” são difíceis de ser suportados por mais de uma vez de exibição.

O filme se passa na ensolarada Califórnia, onde Ophelia (Blake Lively) divide a cama e os frutos de uma rentável plantação de maconha “da boa” com uma dupla de rapazes musculosos: Ben (Aaron Johnson) e seu melhor amigo Chon (Taylor Kitsch). O lucro fabuloso dos jovens traficantes chama a atenção de uma milícia criminosa comandada por uma mexicana durona.

Conforme esperado, no caso de “Savages” as imagens são bem enquadradas, a fotografia primorosa, o som espetacular, tudo certinho como manda o figurino. Até o trio de atores amantes ligados ao comércio de entorpecentes ilegais é tão perfeito e belo que chega a enjoar.

Como o filme não tem muito foco e vários núcleos, a dispersão é natural. Na segunda metade, a coisa toda se agrava irreversivelmente. Numa sarabanda pasteurizada de acontecimentos atropelados, o que não falta são cenas patéticas como a do jantar de Ophelia com seu algoz, a malvada rainha do pó ou a sequência final quando a maior parte do elenco se reúne no deserto para um confronto inexato com direito a duas versões do desfecho sangrento. Não consegue excitar nas mornas cenas de sexo onde a mulher aparece sempre com muita roupa, nem chocar apesar de pretender ser ultraviolento, ou seja, fica difícil acompanhar a trama sem dar uma olhadinha no relógio mesmo quando a pintura de Sir John Everett Millais (Já melhor utilizada como referência em outros filmes) surge na toca do bando de traficantes. Seria uma homenagem inacreditável do grupo de criminosos para receber a bela refém Ophelia?

A alardeada e pequena participação do ótimo John Travolta como um agente federal corrupto também não merece grande destaque. A boa interpretação do astro não consegue salvar este desastre que no fundo é mera apologia às drogas feita por alguém notoriamente adepto a elas, em todos os sentidos.